"Remember, remember, the fifth of november"
V
V
"O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer 'isto é meu' e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não pouparia ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: 'Defendei-vos de ouvir esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém'"
Jean-Jacques Rosseau
Jean-Jacques Rosseau
Hoje, em nosso blog, comemoramos o "3° Dia Mundial da Consciência Anarquista". Uma boa descrição sobre o que é o movimento e porque estabelecemos esta data você encontra no post especial da data no ano passado. Neste ano vamos refletir um pouco sobre algumas vertentes que inpiram o movimento libertário e as motivações por trás destas ideias.
Leon Tolstói, escritor russo anarquista, traz em seus textos uma ideia simples: se para fazer o mal os homens conseguem se unir de modo tão eficiente que muitas vezes os males nem são descobertos, por que não utilizar o mesmo modus operandis para promover o bem? Ou seja, se os homens se unem para cometer crimes perfeitos, esquemas complexos de corrupção, máfias e gangues, ataques violentos em massa, bastaria entender e utilizar esta mesma concepção para organizar ações de paz objetivando um bem social maior (o que traria, consequentemente, a vitória sobre a injustiça do existir).
O conceito filosófico da Tabula Rasa, elaborado por John Locke e base de todo o empirismo, diz que os seres são como folhas em branco, ou seja, sem conhecimento de nada. Toda a sua formação se dá com a experiência no mundo. Aqui não há inclinação para o bem ou para o mal, mas apenas o nada absoluto, que converte em algo durante a trajetória experimental durante a vida. Nesta linha temos a possibilidade de uma inspiração coletiva benéfica, uma vez que corrigindo a ética e o meio que leva o homem a cometer atos maléficos ele passaria a ser bom. Se cientificamente há descobertas que invalidam a Tabula Rasa, a influência que o conceito tem em políticas governamentais, educacionais e sociais são inquestionáveis.
Com isto em vista, voltamos a proposta de Tolstói. O escritor russo foi profundamente inspirado por Jean-Jacques Rousseau, empirista francês influenciado pela Tabula Rasa de Locke, que trazia consigo a ideia de uma liberdade natural dada no momento em que viemos ao mundo. Se o homem nasce como uma folha em branco, então naturalmente ele é livre. Seu condicionamento, sua escravidão e seus tormentos tem origem na sociedade mundana. Logo, se o homem torna-se um produto do seu meio, o meio é responsável por modelar o seu comportamento.
Com este pensamento Rosseau conclui que se todos os problemas tem origem no nosso meio social, provavelmente estes problemas não existiam numa época anterior a constituição da sociedade, nos tempos em que ainda éramos selvagens. Neste caso, aqui surge o conceito de bom selvagem. Os direitos civis não devem prevalecer sobre os direitos naturais, que nos são dados por fazermos parte do mundo. O homem precede a sociedade e não o contrário. Enquanto o homem existe sem a sociedade, a sociedade não existe sem o homem.
Porém existe uma instituição invisível, transparente aos olhos, porém não as sensações, que insiste em nos escravizar. Eu chamo este sistema de hiper-real e a entidade por trás de todo o esquema se chama máquina. Basicamente o sistema, que um dia foi controlado pelos homens, hoje tem vida própria e nos controla. Somos escravos de um sistema que virou o jogo e que criou dependências que faz com que sejamos intrinsecamente ligados a ele.
O movimento libertário prega o desligamento deste sistema. Pede a saída deste mundo condicionado. Como Tolstói disse, a ideia é bem simples: ao invés de construirmos uma máquina que gere padrões do mal, por que não construirmos uma que gere padrões do bem? Por que não objetivarmos uma utopia consciente, onde a proximidade com a natureza, com o bom selvagem, se faz necessária para a convivência harmônica entre as espécies?
Cientificamente, há explicações convergentes com a teoria evolucionista, onde uma vez que o ser humano é produto da evolução de milhares de anos, há características comportamentais do animal que éramos no principio até os dias de hoje. Entre estas características temos o instinto de sobrevivência individual sobrepondo ao coletivo, assim como as realizações prioritárias das satisfações e dos prazeres, o que denota uma propriedade egoísta. Há alguns anos, uma pesquisa foi publicada para demonstrar que o ser do sexo masculino era orientado ao sexo forçado, não consensual. Ou seja, sem os ensinamentos sociais que vem desde o berço e sem a recriminação psicológica proveniente deste padrão de moral, o homem, talvez, fosse um animal estuprador nato.
Se os cientistas estiverem corretos e o nosso desvio comportamental estiver mais relacionado a genética do que ao âmbito social, talvez seja necessário criar um ponto de meio termo para ambas as partes. Seria necessário que uma ação de bem coletivo que trouxesse consigo uma ganho individual, o que satisfaria a nossa parte animal e traria benefícios gerais. Talvez a solução fosse a reconstrução da moral, uma legislação de direitos civis que não entrasse em oposição aos direitos naturais, entre os quais a tão almejada liberdade. Enquanto os anarquistas acreditam na possibilidade de isolar uma sociedade libertária das demais - e assim conviverem em pequenas sociedades cuja bandeira da liberdade é o estandarte maior - eu acredito que uma mudança drástica virá somente quando este nosso atual sistema, regido pela máquina, suicidar-se em sua própria ganância.
Oi, Evandro! :)
ResponderExcluirPrimeira vez por aqui e já me encantei pelo seu espaço. Gostei muito do seu jeito de pensar. :D
Só tenho uma coisa a pedir: atualização no layout.
Se puder dar um jeitinho nele seria legal. Essas letras em branco estão me matando, de verdade.
Obrigado I-Pixel! É um prazer contar com as suas visitas e com os seus comentários! Sinta-se a vontade para criticar ou escrever!
ResponderExcluirSeu pedido foi atendido! Espero que goste!
Abraços!
Esse texto me lembra muito um filme que assisti recentemente chamado "Na Natureza Selvagem". Na verdade o protagonista, baseado no personagem real Chris McCandless, é um admirador dos ideiais de Tostói e Rousseau, o que o motiva a realizar suas ações no decorrer da trama. O cara larga tudo que vive e decide viajar pelo país em busca da real liberdade.Enfim, se não viu, recomendo fortemente.Na real, li grande parte do Discurso sobre as Ciências e as Artes e, embora tenha um discurso um tanto quando envolvente, fui obrigado a discordar das atribuições de Rousseau quanto a origem da desigualdade e desisti da leitura.O modelo de felicidade baseado nos "homens da choupana" talvez faça sentido, mas creio que não se pode menosprezar os benefícios adquiridos com o avanço das ciências e, também, da sociedade.Há de existir um equilibrio entre alguns conceitos, o que parece difícil de se atingir.No mais, só tenho que elogiar o modo inteligente como este texto foi construido, uma leitura realmente bem agradável e contínua.
ResponderExcluirAbraço!
Olá Rafa!
ResponderExcluirJá havia assistido este filme logo quando ele saiu! Realmente é muito bom e é uma excelente dica para quem ainda não pode conferir!
Muito obrigado por seu comentário, que acrescenta ainda mais ao meu texto!
Até a próxima!