sexta-feira, 9 de julho de 2010

Okuribito - A Partida


Esta obra de arte do cinema nipônico é uma das experiências mais agradáveis que pude compartilhar com o meu televisor nos últimos tempos. Este é um daqueles filmes deliciosos, de fácil digestão, com toques suaves de humor e drama sob medida, além de momentos de emoção e um ápice comovente. Se fosse um filme americano apostaria qualquer valor que seria o grande campeão do Oscar.

Não estamos diante de um quebra-cabeça. O filme não é de suspense e nem exige uma bagagem intelectual para sua apreciação. Na verdade é uma trágica comédia, ou talvez um drama engraçado, defina como quiser. O fato é que os mais de 130 minutos do filme passam como num piscar de olhos. Elogios a parte, vamos a história, que embora aparentemente não tenha nada demais, é extremamente bem desenvolvida.

Daigo Kobayashi é um perdedor nato. Assim que consegue realizar o seu sonho de tocar numa orquestra sinfônica e, obter com isto, uma melhor posição social, ele adquire um violoncelo caríssimo especialmente para executar a sua tarefa, porém logo após a sua primeira apresentação, o patrocinador encerra as atividades da orquestra por falta de público.

Logo, Daigo está sem emprego e com um instrumento financiado para pagar. Com o aval de sua apaixonada esposa, ele vende o instrumento e volta para a sua terra natal, numa zona afastada dos grandes centros. Passa a morar com sua esposa na casa que sua falecida mãe deixou de herança. A casa remonta à diversas lembranças que Daigo teve em sua infância, e as lembranças não são as melhores, visto que seu pai - a qual gostava muito - abandonou a casa para viver com outra mulher.

Em sua nova vida, Daigo busca um emprego nos anúncios de um jornal regional. Uma oferta lhe chama a atenção: um ótimo salário para um trabalho que não necessita experiência numa empresa que auxília os seus clientes em suas jornadas. Daigo imagina ser uma agência de viagens e decide ir até a empresa para se candidatar a vaga.

Na empresa, temos a secretária e o chefe, mais ninguém. Na entrevista, o chefe não faz questões, apenas diz o valor do alto salário, que espanta Daigo de tal maneira, que o chefe promete lhe pagar por dia e imediatamente lhe dá um adiantamento. Daigo acaba por aceitar a importância e sua contratação é efetivada.

No dia seguinte, conhecemos o trabalho de Daigo. Eles preparam defuntos recém-mortos numa cerimônia pré-cremação. Eles atuam como uma extensão da funerária. Além de maquiar e limpar o corpo dos mortos num ritual onde todos os familiares observam, também executam um ritual bonito e respeitoso de purificação da alma, antes mesmo de fechar o corpo num caixão.

Porém o trabalho onde seja necessário tocar o corpo dos mortos é considerado uma profissão de baixo escalão. Portanto Daigo esconde de todos o que eles faz, para não desonrar seus amigos e sua esposa. O desenrolar do filme segue uma fórmula interessante: cada vez que o escritório de Daigo é acionado, temos uma experiência totalmente diferente em relação ao morto e os seus familiares. Há casos que são engraçados, outros são trágicos. Outros ainda mesclam um pouco dos dois gêneros. Em alguns momentos, me recordei de uma série antiga da HBO chamada "Six Feet Under" (traduzido como "A Sete Palmos").

Entre cada caso, Daigo beira entre o rídiculo e o dramático, quando seus temores estão próximos de se tornarem realidade e seus fantasmas do passado lhe atormentam ainda mais. A dinâmica do filme faz com que tudo seja muito bem explorado e a temática não acabe por nos cansar. É como se estivéssemos diante de um seriado com diversos episódios de curta duração. Se eu tivesse que falar do que se trata este filme, diria que se trata da relação entre pais e filhos. Daigo - o filho rebelde que nem mesmo se recorda da face do pai e seu inconformismo por ter sido abandonado. Do outro lado o pai - a qual só conhecemos através da perspectiva de Daigo e de alguns vizinhos.

Diante da perspectiva de tantas mortes, além de conviver num local que lhe remete a tantas coisas ruins, Daigo se transforma num herói. É carismático a ponto de sofrermos com suas quedas e sorrirmos com as suas ascensões. Há momentos que os corações mais duros certamente se amolecerão. Se você não quer se desmontar na frente dos outros, aconselho que assista este filme sozinho, por que o risco disto acontecer é real.

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