sexta-feira, 21 de março de 2008

Simplesmente Vulgar

"O pensamento é o discurso silencioso da alma" - Platão, Sofistas.

Observamos tranqüilamente a metamorfose de nosso habitat em uma arena de gladiadores. Porém esta sensação adquirida de tranquilidade é mais um feitiço realizado pela máquina, pois não está ocorrendo uma transformação (conforme diz o mundo das aparências), pois a coisa já é de fato.

Tínhamos um mundo. Vivíamos em harmonia neste mundo. Nem tudo era um mar de flores, porém as pessoas eram mais educadas, havia uma certa moral e um código a ser seguido - mesmo nas pessoas que faziam o mal. A concorrência não era tão desleal, tinha espaço para todo mundo. Os comerciantes podiam ser concorrentes, porém todos sobreviviam: se um tinha o melhor preço, o outro tinha o melhor atendimento, e assim se equilibrava a balança. A proximidade entre as pessoas gerava uma clientela fiel.

Hoje em dia a máquina destruiu o comércio de bairro. As grandes empresas engolem as pequenas, não fica nada para contar, nem mesmo lembranças. As grandes empresas preferem operar no prejuizo apenas para derrubar os concorrentes de menor porte. E conseguem, afinal é um golpe muito baixo e desleal. Quem poderia resistir?

A humanidade também acompanha o ritmo estabelecido pela batuta da máquina: pai mata filho, filha mata mãe, mãe mata filho, filho mata o pai. Filhos matam filhos (reparem que avós não matam filhos nem netos - o que será que ficou perdido lá atrás?). Quando tinha 12 anos (ou seja, apenas há 14 anos) não fazia a mínima idéia de como funcionava o processo de cópula: onde será que o quê entrava em não sei aonde? Embora a professora ensinasse que o processo de gravidez se dava do encontro do espermatozóide do homem - originário do pênis - com o óvulo no útero da mulher. Onde diabo ficava este útero? E como será que o sexo do homem cria estes espermatozóides? Será que para ter um filho o homem deveria urinar em cima da mulher? Ou seja em 1992, ainda havia uma certa inocência no ar para aquela juventude. Um sentimento que deixava os nossos pais mais trânqüilos. Mas ali as coisas já estavam se transformando para o que hoje de fato é: meninas de 12 anos estão grávidas! Meninos de 12 anos são pais! Quando será que eles iniciaram sua vida sexual? Com 10 anos? Com 9 anos? Piedade!

Viraram o mundo do avesso ou será que eu vim de Marte? Por quê vejo estas coisas e fico perturbado, quando todos estão indiferentes aos fatos? Estaria realmente tudo bem? Será que estou exagerando? Me digam como viver com estas questões em minha mente?

Uma hora eu ainda faço uma genealogia de 1900 até os dias de hoje sobre a moral, antes disto vale a pena procurar Friedrich Wilhelm Nietzche para entender que o ser humano é um animal sentimental e este negócio de racionalidade é coisa da máquina. Com esta frieza racional que adquirimos após a modernidade e, mais assintuosa ainda, após a revolução da informação, conseguimos gargalhar, contar piadas, tomar uma cerveja e ficar de namorico mesmo quando a tua vizinha é estuprada pelo próprio pai ou sabendo que o filho de teu amigo morreu assassinado na escola por um coleguinha de sala: os dois tinham 12 anos, o problema é que um torcia para o Corinthians e o outro para o São Paulo... O problema é que um andava armado e o outro não esperava morrer.

E eis aí os humandróides. As lágrimas da humanidade secaram e as tragédias já fazem parte da normalidade e do cotidiano. Observe bem está sentença: A tragédia já é parte de nosso dia-a-dia. A pergunta que fica é: como podemos sorrir diante disto?

Vai começar mais um capítulo decisivo do Big Brother! Corram para suas televisões e deixam estas idéias aqui, no cemitério das reflexões, afinal você tem o direito de escolher entre o pensamento (ou a tristeza) e quem vai para o paredão (ou o sorriso*)!

E assim a tua psiquê poderá me dizer que não teve tempo para ler esta mensagem, e teu consciente te isentará de culpa. Seguindo o príncipio de negação, não há com que se preocupar, tudo está bem, afinal quem saiu do BBB foi o João e não a Maria. Quanto tempo irá demorar até você conseguir pegar no sono, graças a dose de adrenalina que o "jogo da vida" injetou em você? E amanhã você irá discutir calorosamente com os seus colegas sobre o Big Brother, mas quando eu lhe perguntar sobre o que você achou deste post você ficará em silêncio e que o texto era muito longo e não tinha tempo sobrando para ler. Neste instante irá me achar inconveniente e ao ver que eu não compartilho de teu assunto irá se irritar comigo.

* Se você pensou que eu iria dizer "ou a felicidade" saiba que em nossa era não é possível dizer o que é felicidade. A única coisa que é possível definir, ou seja, por fim, é a simulação ou sua realidade de felicidade. A hiper-realidade produz tantas realidades diferentes que não mais compartilhamos os sentimentos de nossos amigos, as únicas verdades são as nossas verdades. Apenas o que enxergamos é real.

Senhoras e senhores, vistam tuas armaduras e perfurem os teus entes! Sejam bem-vindo à arena!

Um comentário:

  1. Tive a oportunidade de conversa pessoalmente isso com você. Concordo com quase tudo, mas devo perguntar algo que receio não ter resposta. Não estaremos no curso natual da evolução? Talvez hoje tenhamos um cenário mais caótico, mas seria ele mais ou menos hipócrita que aquele do passado? Lembremos de Dogville, onde tudo parecia perfeito, quieto e honesto. Mas era apenas fachada de uma podridão sem fim. Não seria assim o passado? Talvez hoje só tenhamos mais coragem (ou talvez liberdade) de ser quem realmente somos. Enfim... só uma ponderação

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