quarta-feira, 24 de setembro de 2008
A Guerra dos Ratos, Gatos, Porcos e Cães
A literatura por trás da Segunda Guerra Mundial é vasta e muito bonita. Por trás de um acontecimento tão cruél e violento surgem centenas de histórias comoventes de resistência e heroísmo. O nazismo, definitivamente, antes de tudo foi uma epidemia de insanidade coletiva que assolou a Alemanha no passado.
Hoje ninguém consegue entender exatamente o porque aquilo aconteceu, nem mesmo os nazistas, após serem capturados, conseguiam justificar com clareza as atrocidades que cometeram, justamente porque não havia explicação: foi tão somente o lado bestial humano liberado para que a sua face animalesca prevalecesse sob a falsa razão, aparentemente, dominante. Quando cai a máscara percebemos que o animal mais selvagem que todo o reino selvagem continua sendo o homem, como se fosse um berserk.
Para mim, o retrato mais cru e emocionante de um destes episódios não está presente nem na tradicional literatura, nem no cinema, mas sim nos quadrinhos: falamos de Maus (ratos, em alemão), do ganhador do prêmio Pulitzer Art Spiegelman – publicado no Brasil pela editora Companhia das Letras e compiladas em um único volume. A história é retratada através de uma série de entrevistas que ele realizou com o seu pai, um dos sobreviventes judeus e refugiados nos EUA.
O que faz Maus ser diferente de tudo o que você já viu é a forma como o relato é apresentado: nos traços simples e sem grandes detalhes de Spiegelman, temos os judeus retratados como ratos – fazendo uma analogia com os seres que sempre estão fugindo. Os nazistas são os gatos, aqueles que estão sempre atrás dos ratos. Os poloneses são os porcos – animal que não inspira confiança e acaba por trair o seu próprio povo em busca da própria salvação. O exército do EUA acaba por ser os cães, aqueles que caçam os gatos e salvam os ratos.
Além disto a trama é apresentada de forma direta e sem adornos, sem música de fundo, sem diálogos complexos ou comovidos, são simplesmente pessoas fazendo o que têm que fazer para sobreviver, se adaptando ao conflito e aprendendo a conviver com as perdas e a transformação de um cenário tranquilizador para um cenário caótico.
O pai de Spiegelman é retratado como um judeu chato, irritante, porém sincero e honesto. Isto não faz dele somente um herói, mas um homem como um outro qualquer inserido num contexto insano. Se o nosso mundo fosse virado do avesso como reagiríamos? Em Maus observamos pessoas nesta situação. Não há exageros nas histórias de seu pai, nem enfeite, nem cores e nem pinturas. Tudo é contado com naturalidade e frieza . Talvez seja este não carisma que torne os personagens tão carismáticos.
Talvez porque eles não sejam nem um pouco perfeitos é que podemos sentir, através da leitura, um pequeno fragmento do que experimentaram, visto que nós nos reconhecemos como seres imperfeitos, e isto dói bastante – a ponto de derrubar lágrimas durante as páginas.
E mesmo após a leitura deste clássico – e de tantos outros que já foram lançados acerca do tema – e mesmo após assistir tantos filmes tão bem representados, continuamos sem entender do que se trata tudo isto e quem é este ser que aparece toda a manhã em nosso espelho.
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