domingo, 28 de setembro de 2008

Marmieládov

Este artigo faz parte de uma série que visa analisar a obra Crime e Castigo, de Fiódor Dostoiévski. Para conhecer todos os outros textos que já foram públicados sobre este assunto neste blog, clique aqui.

(...) é na bebida que procuro a compaixão e o sentimento (...) Bebo porque quero exclusivamente sofrer.” – Marmieládov

Este é um personagem chave na condução da história de Crime e Castigo, principalmente no que cerne as tomadas de decisões do protagonista Raskólnikov.

Marmieládov é um perdedor confesso. Marmieládov, víuvo e com uma filha de quatorze anos, decide se casar com Catierina Ivánovna, recém víuva com três filhos pequenos e desamparada por seus pais. A situação de Carierina Ivánovna é comovente e Marmieládov decide cuidar dela e dos pequenos por toda a sua vida. É uma figura apaixonada por sua esposa e a admira muito por todo o seu histórico, de tal modo que quando é demitido de seu emprego, um ano após o casamento, não aguenta o baque e se entrega a bebida.

Depois de um ano e meio desempregado, consegue um novo emprego, porém perde na sequência por sua própria culpa, provavelmente graças aos problemas ocasionados pelo alcoolismo. Com o aluguel atrasado e pressionado pela condições de miséria a qual vive toda a sua família, vê sua filha do primeiro casamento tornar-se uma prostituta para sustentar a casa. A vergonha desta situação faz com quê Marmieládov reclame o seu emprego de volta com o antigo chefe, que comovido com sua história, decide empregar novamente o ex-funcionário.

A notícia é recebida pela família com muita alegria e esperança, porém após uma semana, Marmieladóv pega todo o dinheiro arrecadado até então e some de casa para gastar tudo em bebida. Logo quando o dinheiro acaba, recorre a Sônia – sua filha prostituta – para pegar dinheiro para beber mais.

Todo este relato é descrito para Raskólnikov em uma taberna onde Marmieládov bebê. Todos conhecem a sua história. Raskólnikov o leva de volta para sua família e questiona se todos os homes não seriam sacanas por natureza, afinal porque Marmieládov, depois de tantas oportunidades, continuava fazendo estas coisas, como bebendo e fugindo?

Marmieládov é extremamente complexo. Faz parte da habilidade de Dostoévski criar personagens psicologicamente confusos, ou seja, eles mesmos estão presenciando uma batalha interna e procuram uma definição para os seus males. Podemos, assim, imaginar que Marmieládov é uma figura que busca uma auto-punição por não ter sido capaz de cumprir com aquilo que havia prometido. Ele quer, com isto, buscar infinitamente a dor mais aguda que possa existir. Conforme fosse odiado além dos limites do próprio ódio, imaginava que seria mais fácil de viver com toda a bagagem mísera que leva em seus pensamentos.

Quanto mais apanhasse, fosse xingado e visto com maus olhos, mais perto de sofrer aquilo que ele considerava justo por tudo aquilo que fez com os seus entes. Enfim, considerava-se merecedor de todo sofrimento.

Coincidentemente, é nesta figura sofrível que Raskólnikov encontra a sua salvação. Em dado momento, enquanto Raskólnikov caminha em meio à uma ponte próxima ao apartamento das vítimas que ele assassinara dias atrás, um grupo de pessoas se agita em frente a um acidente que acaba por acontecer. Tudo indica que a vítima é fatal. Quando Raskólnikov se aproxima curioso para saber o que aconteceu, vislumbra que o pobre coitado esmagado por atropelamento é ninguém mais que Marmieládov. Raskólnikov decide ajudar com cuidados médicos, com a locomoção do ferido até a sua residência, e posteriormente, com a morte do personagem decorrente da tragédia, ajuda financeiramente a sua familia, inclusive no enterro.

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