sábado, 11 de outubro de 2008
La Fille Coupée en Deux
Este filme é o máximo! Não por sua sinopse, que é simples e já foi recontada infinitas vezes, mas pelo desenvolvimento das personagens e brilhante texto. Uma garota dividida em dois, do diretor Claude Chabrol, conta a história de uma linda jovem que trabalha na televisão como a mulher do tempo e que acaba por se apaixonar por um escritor famoso, casado e trinta anos mais velho do que ela. Paralelamente, um jovem milionário e de familia tradicional fica obcecado pela garota e utiliza de todas as artimanhas para tentar conquistá-la.
Dentro da simplicidade da história, temos personagens muito bem construídos que garantem certa profundidade ao telespectador que imerge num mar de questionamentos sobre o velho tema que mais aflige e atormenta a humanidade: o amor. Não o amor sereno, mas aquele que desperta os animais mais ferozes que convivem adormecidos em nosso interior. Não somente, mas paixão, que surge como uma doença estranho, onde prazer associa-se a dor e vice-versa.
Atenção: Contém SPOILERS. Se você não quer saber sobre como o filme desenrola, pare por aqui, visto que na análise abaixo temos coisas que podem comprometer a sua experiência.
Charles Saint-Denis é um escritor famoso e que vive longe dos grandes centros em imensa casa de campo. Já na terceira idade, não possui filhos, porém convive muito bem com sua esposa, a qual se declara mais apaixonado do que nunca. Possui um relacionamento estreito com sua editora, que lhe sugere aparecer em público para divulgar seu novo livro. Homem calmo, culto e inteligente, Saint-Denis se refugia em sua casa para fugir da loucura do mundo e procurar a paz necessária para se concentrar em escrever histórias.
Quando precisa sair para se apresentar ao mundo, percebe-se uma certa inquietação, o que caracteriza que gosta de viver num mundo solitário.
De modo geral, as pessoas gostam da figura serena de Saint-Denis, tanto é que forma-se fila para a tarde de autógrafos numa livraria regional, cuja proprietária é a mãe de...
Gabrielle Deneige. Esta é uma daquelas mulheres que esbanjam uma beleza natural. Sem precisar de grandes cuidados, encanta homens por onde passa. Trabalha na televisão, onde apresenta a previsão do tempo. Extremamente jovem, é admiradora de Saint-Denis e tem a felicidade de conhece-lo nesta tarde de autógrafos. Saint-Denis fica curioso pela garota, e percebendo que em suas poucas palavras ela parece lhe corresponder, faz um convite inusitado para Gabrielle, sendo que ela aceita sem ao menos hesitar. Neste interim, surge a figura de...
Paul Gaudens. Jovem, bem vestido, rebelde, rico e esnobe, logo se rivaliza com Saint-Denis. Lhe pede um autógrafo para logo jogar o livro em qualquer lugar. Se apaixona perdidamente por Gabrielle, de forma que está sempre por lhe chamar a atenção, oferecendo gentilezas, passeios e elogios. Acostumado a ter tudo o que sempre quis, vê em Gabrielle o seu principal alvo e desejar lhe conquistar a qualquer custo. Paul vive sob a sombra de seu pai, que foi um homem muito inteligente e que deixou todo um império para sua família.
De certa maneira, Paul é um pouco excêntrico e extravagante. Talvez porque seu irmão um ano mais velho tenha falecido brincando na banheira com ele, quando tinha apenas 3 anos de idade.
Introduzido as personagens o que temos é quase uma espécie de jogo: o playboy que se enxerga como dono no mundo em busca da menina bonita encantada pelo homem sábio e comprometido, que está tentado em ter um caso com ela, desde que a coisa fique por ali, visto que ele tem uma reputação a zelar e uma esposa a qual dedica o seu amor.
Visto que Gaudens faz tudo por Deneige e que Saint-Denis não faz por ela, e ainda assim é para Saint-Denis que Deneige oferece todo o seu amor, surge uma rivalidade e um ódio que irá ser ponto-chave no desenvolver da história. Afinal, como será que se apresenta a experiência do limitado para aquele que se definine como um semi-deus?
É este inconformismo que alenta a obsessão de Gaudens pela garota do tempo. Depois que Saint-Denis utiliza – se assim podemos dizer – Gabrielle para satisfazer os seus desejos, deixa claro que não mais a deseja, o que faz com que ela fique tão inconformada quanto Paul. Até mesmo em clubes privados de sexo, a qual Saint-Denis é sócio, ela participa para agradar o seu amado. Ainda assim ela acaba por ser descartada e observa que era somente objeto de satisfação que alimenta os desejos do escritor.
Por fim, este sofrimento fará com que ela fique com Gaudens, não por gostar dele, mas como forma de auto-punição. Ele sabe disto e decide casar com ela. Talvez isto mude um pouco as coisas. Porém ela é fria, distante e embora Gaudens tenha o seu sonho concretizado, não consegue se sentir realizado com o coração de Gabrielle ainda pertencendo a Saint-Denis. Enfim, o que ele queria era ser amado, e isto jamais ele conseguiria de alguém que, definitivamente, não gosta dele.
Neste diálogo estabelecido entre as partes, a questão mais pertinente é: seria a paixão simplesmente vivenciar uma certa dor aventureira? Estas personagens não estariam neste estado justamente por vivenciar a possibilidade de algo impossível? Seria a mente humana uma geradora de fantasias onde o interesse é maior por aquilo que está mais distante do que pelo mundo terreno?
Não é dificil encontrar pessoas que vivem este tipo de situação e acabam por se entorpecer de tanta dor e angústia por algo que está além da compreensão.
O mais legal é saber que o cinema francês, que sempre foi um cinema conceituado e que estava em baixa até há pouco tempo, voltou a fazer filmes bons novamente, assim como Le Scanphandre et le Papillon, Coeurs e Les Chamsons D’amour.
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