segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Sidarta

Herman Hesse (1877-1962) é um daqueles escritores que gravaram o seu nome no hall dos imortais, justamente por não ser mais um literato qualquer, mas também um filósofo com um pensamento solidificado sob uma influência enorme do pensamento oriental. Prêmio Nobel da Literatura em 1946, o escritor alemão naturalizado suiço influenciou toda uma geração de hippies graças a busca incessante da perfeição do espírito presente em toda a sua obra.

Sidarta é considerado um dos livros mais importante do autor, talvez por desenvolver um ponto-de-vista único do budismo, talvez por ser um dos meus primeiros escritores ocidentais, ao lado do filósofo Arthur Schopenhauer, a introduzir a filosofia oriental como parte da resolução dos problemas da individualidade do ser, assim como de toda a questão existencial que nos abrange.

Hesse traça um paralelo da vida de Sidarta Gotama, o Venerável, o Buda, aquele que imortalizaria em seus ideais o budismo que iria, posteriormente, refletir toda uma nova visão de como suportar a vida, e o seu Sidarta, o protagonista da história, que tem muito em comum com Gotama, mas também tem seus pontos de divergência que serão evidenciados e discutidos no decorrer da história.

Sidarta vem de um berço nobre. Seu pai é um brâmane muito influente e devoto. Logo, em toda a sua criação ele foi ensinado com todos os preceitos necessários para se tornar um líder espiritual. Conforme ele crescia, as pessoas se espantavam com tamanha destreza, paz e sabedoria, porém Sidarta mesmo não estava satisfeito consigo. Faltava-lhe alguma coisa que não lhe bastava. Ele havia aprendido a jejuar, a esperar e a pensar, porém estava certo que a sua verdade não poderia vir dali.

Sidarta irá abandonar toda a sua vida e se juntar aos samanas em busca de resposta para os seus tormentos. Os samanas eram mendigos que se abdicavam de todos os bens físicos e viviam em meditação e desapego como forma de suportar toda a dor e insensatez da vida, logo, ao meditar, deveríamos anular todos os nossos pensamentos e vivenciar o nada.

Depois de se tornar um aluno exemplar, praticando todos os exercícios com louvor, Sidarta ainda não está satisfeito e começa a questionar a própria filosofia dos samanas: afinal, meditar não seria fugir de si próprio? Neste caso, a bebida também não teria efeito semelhante? Mas o que realmente importa não seria lidar consigo mesmo? Como domar a fera que temos dentro de nós? Num dos momentos mais curiosos do livro, Sidarta se encontra com Gotama, o Buda, e questiona a sua filosofia respeitosamente com estas dúvidas.

Dai por diante, Sidarta para de fugir de si mesmo e resolve se entregar ao mundo: começa a viver uma vida de paixões nos braços da bela Kamala, aprende os artifícios de um bom comerciante até que se enriquece, se diverte apostando altos valores em jogos de azar, se torna avarento, amargo, e ainda assim falta alguma coisa que lhe faça completo. De um miserável mendigo à um respeitável comerciante, Sidarta ainda está angústiado. Perdido, começa a caminhar sem destino e a morte lhe passa pela cabeça.

Porém a natureza lhe salva. O rio, em seu movimento infinito, onde sempre passa e sempre está ali, como se estivesse movimentando-se sem sair do lugar, desperta uma nova vontade de viver em Sidarta, que começa a entender certas coisas que buscava em sua jornada espiritual. Logo ele começa a conviver com um barqueiro, que lhe ensina a ouvir os conselhos que o rio tem a dizer.

Um dia, entretanto, Kamala aparece com uma criança para fazer a travessia do rio, mas naquela noite uma cobra venenosa pica a mulher que acaba por falecer. A criança, acostumada as vícios e bonanças de uma vida repleta de riquezas, começa a odiar ter que conviver com seu pai Sidarta, e está sempre por lhe humilhar, por mais bem que ele lhe faça. Numa noite ele decide fugir e Sidarta, aconselhado pelo rio e por seu amigo, decide não mais ir atrás do filho, conformado que aquele era uma sina irreversível e que nada ele poderia fazer.

Por fim, em meio a angústia de ter alcançado uma certa idade e ainda não ter atingido a sabedoria que tanta almejava, Sidarta cai em pratos perto do rio, que passa a lhe provocar uma experiência única, indizivel, que faz com Sidarta, assim como o Gotama, atinja a iluminação e a sabedoria plena. Dali por diante, Sidarta se torna um barqueiro sereno e famoso, cujo antônimos descobre que são exatamente a mesma coisa: vida ou morte, bem ou mal, no fundo são exatamente a mesma coisa, por isto não devemos adorá-los, quanto menos temê-los.

Sidarta é um pequeno livro mas que traz consigo uma possibilidade de reflexão muito grande. É um vasto material para abstrair raciocínios complexos e importantes, um livro que deveria ser lido por todos por seu carácter filosófico e psicológico, onde a busca incessante pelo conhecimento leva o homem à conflitos supremos e dolorosos, quando muitas vezes o que existe é apenas a sede de saber: o saber, talvez, não passe de um objeto inexistente ou uma idéia fictícia.

Sidarta
Herman Hesse
Editora Record
50ª edição - 2008 - 180 páginas

2 comentários:

  1. Não sei se a resenha é sua, mas em todo caso parabéns por ela e pelo bom gosto cultural. Gostaria de lhe recomendar a música "Close To The Edge" da banda inglesa Yes. A música faz referências ao livro do Hesse e cria um ambiente incrível para o tema, tanto para uma maior compreensão do livro quanto para a sua própria leitura. E parabéns pela resenha do Ok Computer, excelente analogia de um grande álbum.
    Abraço

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  2. Obrigado por seu comentário Danilo! Precisava de algum material para um novo post sobre música e irei me valer de sua dica!

    Espero que você volte outras vezes!

    Abraços,

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